Entre os diversos transtornos psíquicos que acometem milhões de pessoas no mundo, a Síndrome de Burnout, ou Síndrome do Esgotamento Profissional, não é uma doença que tem sua causa individualizada. É, na verdade, um fenômeno psicossocial. Sua principal característica é o esgotamento físico e mental do indivíduo em função das más das relações de trabalho e de gestão em seu ambiente organizacional.
A doença pode se manifestar das formas mais variadas. Desde o isolamento dos colegas, fobia do ambiente de trabalho, apatia diante das tarefas, desinteresse, cansaço extremo, dores no corpo, tristeza até, contraditoriamente, a quadros de produtividade extrema ou sensação de onipotência. É o caso dos chamados “workaholics”.
Muitas vezes, o trabalhador nem sabe que está doente. Geralmente só percebe quando procura ajuda profissional por alguma somatização: dores no corpo, fadiga ou outras queixas.
Quase sempre a busca por ajuda acontece quando o sofrimento psíquico chega a um grau de despersonalização que começa a afetar não só as relações no trabalho como no ambiente familiar ou social “O indivíduo não vê mais a necessidade do outro”, diz o psicólogo do Centro de Estudos de Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh), Leandro Gouget.
De acordo com Leandro, cada pessoa responde ao tratamento psicológico, e também à medicação, de acordo com a capacidade de seu aparato psíquico. “Com a síndrome de burnout, a realização de cada tarefa exige uma energia extrema do aparelho psíquico do profissional.” O grau de resistência a essa perda energética varia de um trabalhador para outro e vai determinar quem adoece e quem resiste ao esgotamento sob as mesmas pressões e condições no ambiente de trabalho.
Produtividade e metas na raiz do problema
O modo de organização que tem predominado no setor privado é o da produtividade por metas E este modelo tem sido amplamente difundido no setor público: a busca por mais resultados no menor espaço de tempo e com o menor custo para as empresas, no caso do serviço público, nos órgãos e instituições de todas as esferas. O aumento da carga de trabalho promovida por uma gestão focada em metas pode adoecer qualquer um.
Limitar a potencialidade também adoece
Uma situação comum pela qual passam os que sofrem de burnout são empregadores ou chefes que impedem que o funcionário exerça sua capacidade de trabalho de forma plena ou o desvia de função sem sua concordância. A impossibilidade de progredir ou ascender, as relações conflitivas com colegas - levados a competir entre si pelo modelo de gestão adotado -, além do o alto nível de exigência para atingir metas, muitas vezes impossíveis, são outros relatos comuns aos que adoecem.
“O trabalho nunca é indiferente ao homem. Ou ele vai adoecer ou vai produzir saúde”, diz o psiquiatra e psicanalista Philippe Dejours, uma das referências internacionais no estudo das doenças do trabalho, segundo Leandro. O psicólogo chama a atenção para o caráter coletivo do enfrentamento às doenças do trabalho.
Segundo o especialista, é preciso perceber que os sintomas do transtorno são individualizados, mas suas causas não. São sempre de ordem gerencial e de responsabilidade do empregador ou empresa. “O enfrentamento à doença passa pelo tratamento terapêutico, pelo suporte da família, amigos e a criação de novos vínculos afetivos e até profissionais. Mas também pelo debate entre os profissionais, instituições de saúde e entidades representativas dos trabalhadores sobre os modelos de gestão que estão adoecendo as pessoas”.
A síndrome de Burnout está descrita na Classificação Internacional de Doenças (CID10), versão 2010, pelo código Z73.0 Burn-out (estado de exaustão vital) e é juridicamente válida para que o trabalhador tenha direito ao afastamento por licença saúde ou seja indenizado em caso de demissão.
Uma vez provada a doença e o nexo causal com o trabalho, o empregado terá reconhecido pela Justiça do Trabalho o direito ao afastamento para tratamento, indenização pelos gastos que tiver, pensão por eventual incapacidade para trabalhar, além de indenização por dano moral.
O laudo tanto do terapeuta como do médico psiquiatra são fundamentais para provar o nexo causal da doença. No caso da licença pelo INSS, muitas vezes são necessários vários laudos até que o perito se convença do estado do trabalhador e da necessidade de tratamento. Ainda que tenha sido negado o direito a licença pelo INSS, o trabalhador pode recorrer à Justiça do Trabalho e, nesse caso, utilizar os laudos técnicos.
Manuella Soares, Jornalista
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