O Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh/ENSP/Fiocruz) realizou o primeiro Encontro Integrativo do Cesteh no ano de 2024. O tema escolhido foi Exposição ao Amianto: novos e velhos desafios, assunto que tem voltado as pautas de discussão, principalmente depois de um parecer favorável de uma Juíza do Trabalho Titular, do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, na Bahia para a empresa Dow Química. Para participar do evento, foram convidados a pesquisadora e pneumologista do Centro Patrícia Canto, o pesquisador e médico sanitarista Francisco Pedra e a pesquisadora, pedagoga e mestre em Saúde Pública Eliana Felix.
Caso Clínico
O caso clínico de um jateador de areia da indústria naval, atendido no ambulatório do Cesteh, foi apresentado pela pneumologista Patrícia Canto. Ao longo de seus 22 anos de trabalho na área, o trabalhador teve contato com amianto por apenas seis meses. Ele começou o seu acompanhamento no Cesteh em 2002 com quadro leve, que teve evoluções, desenvolvimento de comorbidades ao longo dos anos e controle da doença do qual foi diagnosticado, Pneumoconiose com repercussão funcional.
O desconhecimento da proximidade com o amianto é muito comum entre trabalhadores. Segundo a pneumologista, muitos deles tem contato com a substância e não sabem disso. “Muitas vezes o quadro radiológico é compatível com exposição ao amianto, com placas pleurais e calcificações, mas o trabalhador diz que nunca trabalhou com amianto, só que não tem outro agente que possa causar essas complicações. A gente sabe que é amianto pela característica clínica e tipo de trabalho. Não é raro que o trabalhador tenha trabalhado com a substância e não saiba disso”, explicou. Além do diagnóstico e todo acompanhamento realizado pelo Cesteh, o trabalhador teve a orientação de procurar o sindicato para a emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT). Por conta de toda exposição, o trabalhador também colocou o estaleiro do qual trabalhava na justiça, e teve causa ganha após 10 anos.
Com a apresentação do caso clínico, a médica pneumologista aproveitou para explicar um pouco mais sobre o atendimento do ambulatório de pneumologia do Cesteh. “Recebemos esse trabalhador encaminhando pelo seu sindicato e começamos o acompanhamento. Nosso ambulatório é aberto, então, recebemos trabalhadores encaminhados por sindicato ou marcações diretas por meio do Sisreg. No primeiro momento avaliamos a história clínica e ocupacional desse paciente, com um questionário padronizado de sintomas respiratórios”, explicou a pesquisadora, salientando que o fator determinante de como será o acompanhamento desse paciente é o resultado de exames, por exemplo, a tomografia.
Caso Dow Brasil
O médico sanitarista Francisco Pedra trouxe para discussão o caso da multinacional Dow Brasil, localizada no município de Candeias, na Bahia, que segundo o pesquisador, “desobedece a decisão do STF de banir o uso do amianto no Brasil”. A afirmação é baseada na decisão de uma Juíza do Trabalho Titular, do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, que liberou a utilização do mineral pela empresa até outubro deste ano. Atualmente, a empresa tem em estoque 115 toneladas de cloro-soda em sua planta. “Uma poeirinha de nada pode se tornar uma dose fatal. Não há uma dose segura para a utilização desse mineral, essa história do limite do uso do amianto é pura balela” reforçou.
Na última semana, o médico sanitarista escreveu um Parecer Técnico sobre a utilização do amianto pela empresa. No documento, o pesquisador questiona a justificativa utilizada pela juíza, além de apontar diversos perigos e retrocessos com a liberação “extraordinária”, opinião reforçada na sua apresentação. “Em dado momento da sua decisão, a juiz alega que ‘a exposição ao amianto na atividade de produção do cloro pelo método eletrolise é sem a exposição de pessoas ao material’, o que me fez questionar: se é tão seguro assim, não seria necessário proibir o uso nem obrigar a empresa a mudar a tecnologia empregada”, salientou. Outro apontamento do pesquisador foi em relação a quantidade de trabalhadores que teriam contato com o mineral. “A empresa utiliza na sua defesa o fato de que “apenas” quatro trabalhadores irão manusear o amianto. Mas quem escolhe esses trabalhadores? É o dono da empresa, seu filho, algum engenheiro? Isso não é relevante. Cada vida humana importa!”, enfatizou.
A matéria e o Parecer Técnico você poder ler clicando aqui.
Resultado de pesquisa
Já a pedagoga e mestre em saúde pública Eliana Felix apresentou o resultado do trabalho Itinerários (im)possíveis da saúde e trabalho de homens e mulheres expostos ao amianto na região de Pedro Leopoldo-MG, finalizado no ano de 2023. O estudo buscou observar a saúde e ambiente desses trabalhadores após o banimento do mineral. “ Muitas questões me incomodavam, por exemplo, a alta frequencia de óbitos entre aposentados e pensionistas dos quais não se conhece a causa e a estimativa de pico de morte no Brasil por mesoteliomas e câncer de pulmão entre os anos 2021 e 2026”, salientou a pesquisadora que teve essas questões norteadoras para pesquisar caráter quantitativo, retrospectivo e descritivo de expostas e expostos ao amianto da população de associados(as) da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto de Minas Gerais – ABREA- MG e domiciliados na região Mineira de Pedro Leopoldo- MG.
O estudo, que teve como seu objetivo analisar relações sociais de gênero com os itinerários no trabalho e saúde percorridos por expostas e expostos ao amianto, apresentou resultados que geraram surpresa da pesquisadora. “Eu me deparei com uma realidade muito pior do que pensei, por isso tive que ampliar a discussão”, pontuou. Em sua apresentação, Eliana Felix apresentou os resultados obtidos pelo estudo, dentre eles, o Quadro Registro de adoecimentos desses trabalhadores, que aponta, por exemplo, 12 casos de trabalhadores com Mesotelioma, 13 com câncer de pulmão, todos eles homens, e 12 trabalhadores com câncer de tireoide, sendo sete homens e cinco mulheres. Todo o resultado da pesquisa você pode ver no documento abaixo.
As apresentações e debate final você pode assistir no vídeo disponível no Youtube clicando na imagem abaixo.
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